DealflowBR #51 - Valuations Altos, Preferência de Liquidação e Narrativas
E mais, VC está bombando na Ásia, de acordo com CBInsights, e outros diversos links de leituras interessantes...
Olá, aqui é o Guilherme da Astella, gestora de Investimentos Seed e Series-A em empresas de SaaS, Marketplace e Consumer. A DealflowBR é minha newsletter pessoal, com suporte de colaboradores, enviada ~quinzenalmente sobre Startups, Venture Capital e Investimentos em Tecnologia. Do que escrevo aqui, ~80% é uma curadoria de conteúdo do que tenho lido e ~20% são análises, insights e opiniões próprias.
Bom dia,
A edição de hoje terá um menor número de tópicos mas com bastante conteúdo. Está formatada da seguinte forma:
Como a precificação alta de um investimento e a preferência pela liquidez implica no sucesso de uma Startup, principalmente para os founders
O poder da narrativa no ambiente atual
Alguns dados interessantes do relatório sobre VC no mundo, de acordo com a CBInsights
Boa leitura!
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O que os valuation altos implicam para fundadores
Há uma tese de investimento no mercado de Venture Capital chamada de Early exits que, basicamente, significa buscar uma saída em um tempo menor de maturação a um TIR satisfatório. Essa tese geralmente funciona para investidores anjos, e aos próprios empreendedores. Por exemplo, o investidor anjo que investe a um valuation menor de R$ 10 milhões e em cerca de 4 anos a empresa é vendida por R$ 30 ou 40 milhões, gerando um TIR anual bruto do investimento de 30%-40% do investimento.
Com o boom de M&A de empresas de tecnologia dos últimos meses, esses tipos de desinvestimentos têm acontecido bastante.
A mentalidade dessa tese geralmente não funciona para o Venture Capital institucional, dada a sua matemática e a teoria de portfolios VC fundamentais, que tem como um dos princípios básicos o de acertar grande(“home runs”). Venture Capital é um negócio de investimento em busca do risco assimétrico, no qual - extrapolando - a ideia é apostar no risco de perda de 100% do capital (ou 1x do seu custo do investimento) para poder ganhar muitas vezes.
Com o entendimento maior do mercado investidor sobre Venture Capital, mais pessoas estão investindo em Startups, o que tem aumentado a oferta de capital nos primeiros estágios e, consequentemente, os preços dos ativos.
Então, o ambiente vem mudando e a tese do Early Exit está mais difícil de se concretizar, dado que os pontos de entrada de preço hoje estão mais alto, em razão desse motivos citados aqui e diversos outros que tenho trazido nas últimas edições da DFBR. Um exemplo disso é o caso da Gotham Gal, renomada investidora anjo profissional, escreveu um texto no seu blog dizendo que provavelmente 'esteja saindo do jogo' de investimento anjo porque não encontrava mais as precificações viáveis para fazer sentido ao seu modus operandi.
Mas, mesmo no mercado de Venture Capital, as saídas menores acontecem, e muito. A maior parte das liquidações de investimento de startups dos fundos VC são menores que os objetivos das apostas feitas em seus investimentos. Micah Rosemblom, da Founder Collective, fez um tweet transparente sobre os seus resultados da sua gestora, que deixa isso claro. Nos últimos dois anos, a sua gestora teve 19 exits do fundo - o que parece ótimo - mas que a mediana das saídas foram tiveram um valor na saída de US$ 44 milhões, e um funding de US$ 18 milhões.
Isso quer dizer que são poucas as investidas que realmente atingem o objetivo do Fund Returner (o “home run”), e, então, sendo a grande maioria trazendo retornos abaixo do esperado - as famosas Leis de Potência do Venture Capital.
Como ele coloca ainda, a grande maioria(11 dos 19 desinvestimentos) foram saídas menores que US$ 100 milhões. Sendo apenas uma chegou a mais de US$ 10 bilhões, e outras quatro maiores que US$ 1 bn. Uma bela taxa de sucesso pelo lado de sucesso.
Partindo desses números, o tweet dele tem várias pontos importantes para os fundadores de Startups que pensam em levantar com Venture Capital, como:
Fazer a captação de investimento com VC é mais fácil do que vender a empresa (o exit).
O fundador não deve pensar como o VC, pois o empreendedor geralmente tem um risco de concentração. Todas as suas participações estão em um ativo só.
Mesmo em saídas menores, gerenciando bem a diluição do time, pode-se obter ótimo retorno para os fundadores.
Dado os valuations atuais do mercado de Venture Capital, essas saídas ‘menores’, que costumavam ser satisfatória para fundadores, ficam mais difíceis de acontecer. E nesse ponto gostaria de entrar mais a fundo para trazer alguns motivos. →
O lado ruim de se levantar capital a um valuation super precificado
Para o fundador, levantar investimento a um valuation maior parece sempre a melhor escolha lógica. Melhor avaliação da empresa, menor diluição de suas participação, potencialmente pode levantar mais capital no futuro.
Porém, quando se levanta rodadas com valuations maiores do que o razoável, abre alguns precedentes para se levar em consideração:
A gestão expectativa com os stakeholders - investidores, funcionários, co-founders - fica acima do esperado e pode ser tornar difícil de gerenciar, e criar mal-estar. A barra para mostrar eficiência e retorno em cima de uma maior montante de capital é mais alta.
Potencialmente, reduz as opções de financiamento em uma próxima fase. Teoricamente, quanto mais próximo do mercado público, mais pesos terão os benchmark dos múltiplos de mercado. Portanto, a ideia é que, quanto mais a Startup avança nos estágios de investimentos, o múltiplo de valuation da empresa deverá ir em direção aos benchmarks do mercado.
E, como comentado acima, isso deve limitar também as opções de saída. Principalmente, porque ‘downround’ ou um valuation menor que o de alguma rodada significaria uma perda para as partes da sociedade da empresa. Geralmente, em razão do termo de preferência de liquidação, uma operação dessa deixaria o exit penoso para os detentores de ações ordinárias, ou os fundadores.
Logo, esse ponto da preferência de liquidação é extremamente relevante em um saída. Se o empreendedor desconhece esse termo nos seus contratos de investimento, isso poderá se transformar em um rota de uma saída bem sucedida, assim como o iceberg foi para a rota do Titanic.
Essa clausula garante que o fluxo dos recursos de um evento de liquidez ocorra de forma preferencial para os investidores. Ainda, se há outros investidores, esse direito respeita uma lei de 'cascateamento'(waterfall), ou senioridade, em que, geralmente, as ações sem esse direito - as do time fundador - é a última a receber os recursos, dado o pagamento aos investidores anteriormente.
A preferência de liquidação começa em 1x o montante investido e pode chegar a patamares maiores. Em uma negociação com um investidor, a lógica é que quanto mais acima do razoável para o valuation maior poderá ser pedida de preferencia de liquidez, como 2x seu investimento, em razão do aumento do risco dado o alto valuation.
Sobre Narrativa de Empresas
Li um texto recentemente sobre narrativas para empreendedores que entrou para o hall das melhores leituras de todos os tempos (da última semana!). Vou destilar aqui minhas notas, reflexões e insights sobre o assunto:
Acredito que já é convenção que é papel do CEOs transmitir o progresso e as promessas de uma startup. Não só para investidores, mas para todo mundo, e essa amplificação da narrativa tem cada vez mais importância no ambiente de Venture Capital hoje em dia.
Mas, começando sobre o processo de captação de investimento, o autor segrega como existindo três tipos de narrativa de pitch em um processo de fundraising, e o que elas comunicam:
Narrativa: o que a inflexão poderá ser
Inflexão: sobre os segredos descobertos
Tração: sobre o passado e capacidade de execução, mas que ainda falta alguma história sobre o futuro.
É cada vez mais claro para mim - e acho que para todo mundo - que a narrativa tem um papel extremamente relevante no processo de construção de empresa. Em mercados incertos como de Venture Capital, a narrativa tem mais relevância e sentido. É difícil comprar a narrativa em mercados extremamente tradicional ou ultrapassados.
O autor coloca de uma forma bem interessante a relação da narrativa com os múltiplos de valuation. Empresas com a mesma receita tem múltiplos valuation sobre receita tão diferentes. Trata-se, muitas vezes, da narrativa do que aquilo poderá se transformar no futuro, geralmente em termos de performance.
Essas narrativas geralmente giram em torno de aspectos como: a 1) ampla dinâmica do potencial de resultados, 2) o potencial de LTV futuro, 3) novas avenidas de crescimento e 4) plataformização e efeitos de rede e outros 'loops' dominantes...
Ainda nessa linha de múltiplos, o autor sugere uma comparação bem interessante da alavancagem da narrativa como relação de Preço/Lucro(Price/Earning ou P/E) de uma empresa. Então, nessa perspectiva o investidor avalia o valuation(preço) da empresa em relação ao seu lucro. Uma empresa com um múltiplo de P/E maior quer dizer que a empresa terá um crescimento e lucro maior no longo prazo para encontrar a atual expectativa lá na frente ou então que, a partir da entrega do esperado, renove narrativa e mantenha o múltiplo alto. Para isso, ela precisará demonstrar um bom ROIC, ou seja, que está alocando o capital de forma que esteja trazendo bons retornos.
Tesla e Nubank, para mim, são empresas de narrativas excepcionais, acompanhada de uma execução que atende muito bem essa alta expectativa, por isso seus múltiplos seguem altos e geralmente renovados. Do outro lado extremo, há empresas que tiveram grandes fraudes e corrupção, se torna muito difícil reverter a percepção, o que é apresentada nos múltiplos.
Sobre execução, eu gosto muito da definição que o Eric Santos, CEO e Cofundador da RD, cita que não significa você apenas fazer, mas sim comunicar que o padrão de entrega e de execução para garantir o que foi prometido. E, se todos entenderam, poderão esperar por aquilo.
Essa relação da narrativa em relação a expectativa é bem interessante, não só apenas para múltiplos de mercado, mas também para recrutar talentos, aproximação de clientes e coordenação interna.
Capital é um recurso para reduzir o risco das empresas. Com a grande liquidez e oferta de recursos de Venture Capital, esse recursos de investimentos estão se tornando menos escasso que outros. Por exemplo, talentos e desenvolvedores brilhantes , ou adquiri clientes, tem sido algo mais difícil, e maiores bloqueadores do sucesso das empresas, que captar investimentos.
Então, a narrativa hoje deve ser aplicada, e talvez focada, para outras atividades que envolvem alto risco para cumprir as expectativas.
Então, a narrativa é um recurso de extrema importância para reduzir o risco de uma empresa, e não apenas um artefato para múltiplo de valuation.
Lembrando, narrativa é o papel o CEO, e ele deve ter o poder de usar a seu favor, de forma holística deve utiliza-la como alavanca de reduzir os riscos da empresa seja pessoas, marca, vendas, capital etc...
Esse texto é cheio de insights sobre o assunto. Link do artigo.
Relatório do 3T21 da CBInsights sobre o ambiente de VC no mundo
Folheando o relatório Q3 2021 State of Venture da CBInsights vi alguns dados que trazem destaques interessantes.
Além dos recordes atrás de recordes de investimentos de VC globalmente, a Asia é o continente que mais tem acelerado a quantidade de mega-rodadas e a proporção de investimentos em relação ao resto mundo.
Além disso, a Tiger Global perdeu o posto de investidor mais ativo no 3T21 para a Sequoia da China:
O mercado mostra sua agressividade com mais rodadas e acontecendo mais rapidamente entre elas. Os dados mostram que a mediana de meses entre rodadas vem se reduzindo. Agora, o problema aqui é que não há dados que as empresas estão realmente melhores, o que está fazendo mais unicórnios 'de papel'. Mas, parece que enquanto os múltiplos e número de saídas permanecerem altos, está tudo bem.
É possível baixar o relatório completo nesse link.
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